terça-feira, 18 de outubro de 2011

Um Poeta no Deserto

    Todo escritor tem um dia que descobre que não se é escritor todo dia, explico melhor. É um processo muito interessante, você estava escrevendo com muita suavidade, com poucos dias de deserto literal, sempre encontrando um oásis de historias e lá colhia poemas, contos, crônicas para seus leitores. Este, que é uma namorada difícil de conquistar. Mas você escrevia e isso lhe fazia bem, pois sempre quando escrevemos coisas boas, chegamos ao ponto final e vem uma sensação de dever cumprido.

             Até que você começa a andar por este deserto, e anda e anda, come o que havia colhido, e naturalmente caminha esperançoso pelo próximo oásis.
Mas nada aparece, nada, nenhum poeminha, nenhuma frase, nenhum sentimento sincero, e o escritor entra em uma desidratação de orgulho, uma fome literal, uma abstinência daquela sensação gostosinha do ponto final. O escritor delira, mira visagens, falsos oásis, e escreve, mas ninguém engana o leitor, e vão se as folhas do caderno se depositando no lixo, este que é o maior livro de todos, a antítese do Haikai. Em meio a este deserto, na sede e na fome, é que o escritor percebe que não se é escritor todo dia. Mas como é ruim não dominar as palavras, estuprar a vida e tentar tirar dela uma poesia, ser superficial e não ter nada a entregar para este leitor que antes de ser outro, somos-nos. Ai! Como é ruim quando acordamos engenheiro, quando acordamos outra coisa que não escritor.

                Neste contexto é que se testa o verdadeiro escritor, aquele que tira agua da pedra, que no deserto se faz profeta, que não se entrega. Aquele, que olha para o céu, e percebe que não é estuprando a terra que se colhe flores, que não é comendo terra que se faz fértil. Mas sim reconhecendo, ao olhar o universo, que a poesia sempre esteve ali, pois percebe que as estrelas são as flores do deserto.                 

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